terça-feira, abril 26, 2005

A música na Casa

4 anos depois e muitos, mas mesmo muitos, milhões depois, a Casa da Música (CdM) está pronta e foi inaugurada.

Pronta?

Bem, parece que quase pronta, já que segundo alguns seguranças, ainda há problemas a resolver como portas que empenam, elevadores que avariam… Mas pronto, já dá para os gastos e lá vai funcionando conforme os deuses permitem!

Agora mais a sério…

Tenho sentimentos mistos por esta obra. Enquanto peça escultural transformada em obra arquitectónica, parece-me excelente, ao nível de um Museu do Guggenheim em Bilbau. Os seus ângulos, o seu aspecto de diamante bruto por lapidado, o uso do betão e do vidro em grande escala agrada-me. Mas não me agrada o local, desde o principio. Não por qualquer motivo mais ou menos irrelevante como os que tenho lido aqui e ali, mas porque o local, a Praça Mouzinho da Silveira (aka Rotunda da Boavista) tem uma característica muito própria e rara no Porto e em Portugal – que é ser REDONDA! E o edifício veio quebrar, não só em planta mas também de facto e visualmente, esse efeito. A rotunda da Boavista agora apenas o é enquanto espaço de circulação automóvel e não enquanto espaço visual delimitado por edifícios que a constituíam assim. Tenho para mim que a CdM no topo do Parque da Cidade estaria muito melhor enquadrado e teria resolvido esse “imbróglio” que se vem desenrolando paralelamente… O espaço verde aberto, a possibilidade de confrontar-se com o mar, a ausência de definição de espaço urbano nesse local, todos estes elementos contribuiriam para que a CdM se encaixasse no local perfeitamente, sem se perder nenhum dos seus encantos exteriores e possivelmente ganhando alguns encantos interiores também.

Preocupa-me agora que o autor da obra, Rem Koolhas, não esteja de acordo com a solução adoptada para as traseiras da CdM (o famoso projecto da ADICAIS) e com os "tapamentos" que o mesmo pode vir a trazer à obra. Parece-me que o ideal era um entendimento entre todas as partes envolvidas de forma a que o prédio não fosse construído ou, na pior das hipoteses, fosse de muito menor volume do que o previsto - mas o fundamental é não depauperar ainda mais o contribuinte que já muito foi prejudicado neste processo todo! Aliás, é inadmissivel uma derrapagem deste tamanho (de cerca de 20 milhões para cerca de 100 milhões) numa obra pública - onde logo à partida todo o projecto é muito mais descriminado e pormenorizado que numa obra particular. E aqui, tenho quase a certeza absoluta, o arquitecto é, também, responsável pelo assunto....

Mas outro problema que muito desagrada é a incapacidade de receber espectáculos como óperas ou bailados pela simples inexistência de um fosso junto ao palco! Uma obra destas, com esta dimensão, que custou o que custou e que teve tantas alterações de projecto ao longos dos longos anos que demorou a ser erguida, não podia - não devia - deixar de poder albergar todos, absolutamente todos, os espectáculos que o género musical permite executar. A culpa julgo que não é do projectista, que se terá limitado a executar o programa previsto pela entidade adjudicatária, à época julgo que a Porto2001. Mas se não fez pressão e não alertou para essa lacuna, infringiu uma regra que os arquitectos deveriam seguir e que passa por analisar criticamente o Programa da Obra e propor as alterações alertando o requerente para as consequências futuras.
Se foi a entidade adjudicatária que assumiu de per si não incluir a possibilidade de realizar óperas e bailados, julgo que essa terá sido a “cereja em cima do bolo” que foram as más decisões que arrastaram a cidade em obras intermináveis mais de 4 anos depois de concluído o evento que levou a que essas mesmas obras fossem executadas!

Sobre o interior não me pronuncio (ainda) visto que o conhecimento que tenho da obra é apenas exterior, ainda não tive a oportunidade de a visitar por dentro. Mas do que vi em revistas e na TV parece-me que interiormente a CdM estará à altura (se não for mesmo superior) ao que ela é exteriormente. Mas isso fica para outra crónica.

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